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Há momentos em que cabe à sociedade civil – e somente a ela – decidir sobre o grau de sacrifício que está disposta a enfrentar para obter benefícios. Caso do debate existente hoje, nos Estados Unidos, sobre os novos equipamentos, e procedimentos, concebidos para identificar pessoas que, em trânsito por aeroportos, possam representar algum tipo de risco. Recentemente, uma lei aprovada pela Câmara dos Deputados forçou a Prefeitura de Ilhéus a adquirir um equipamento de raios X para o
aeroporto Jorge Amado. Gasto exagerado? Dispensável? Os deputados que
representam o povo dessa comunidade do sul da Bahia decidiram que não. Versão superavançada do equipamento de uso médico, ele forma uma imagem de grande nitidez do corpo do passageiro, de modo a mostrar claramente os objetos ocultos sob a roupa, seja qual for o material. O fabricante – a American Science & Engineering, Inc. – garante que a imagem produzida pelo equipamento é tão perfeita que permite identificar com precisão, no corpo da pessoa radiografada, explosivos líquidos e plásticos, armas de fogo manufaturadas com qualquer material, armas brancas (facas) feitas com metal ou cerâmica, drogas e até lâminas embutidas (em caixas de madeira, por exemplo). O problema é que essa superimagem também permite ver os mamilos de uma mulher ou detalhes dos órgãos genitais masculinos. O que seria sua principal vantagem tecnológica representa também seu maior incoveniente. Organizações Não Governamentais – e até entidades oficiais americanas – ameaçam entrar na Justiça para impedir que a máquina seja usada em aeroportos, sob o argumento de que viola o direito à privacidade. As autoridades argumentam que os operadores do equipamento serão do mesmo sexo dos passageiros examinados, mas isso é o mínimo mesmo que elas poderiam oferecer. Outra proposta é que as imagens reproduzidas não sejam arquivadas, para evitar manipulação. Há também a sugestão de a própria máquina gerar algum tipo de borrão encobrindo partes específicas do corpo do passageiro. A tecnologia avança rápido, sem dúvida, entretanto a verdade é que não é ela que está em jogo nesse momento. O que está na berlinda são os nossos padrões de convivência. Os sentimentos que experimentamos sobre idéias que vão expor de forma mais ampla a nossa privacidade. O debate, amigos, é sobre o quanto estamos dispostos a transigir – ou a aceitar – para enfrentarmos um inimigo oculto, que não avisa antes de atacar. |